Cordel "o homem do jirau encantado"
O homem do jirau encantado.
Fui buscar
inspiração na Escritura Sagrada, que diz que o preguiçoso é uma alma condenada.
Por vários motivos, é uma criatura que não é exemplo de nada.
Quem tem preguiça é
réu da sua própria mazela, pois esquece de agir segundo se espera dela. Que o
ser humano foi feito pra produzir.
Também não pensa
nem age com o discernimento verdadeiro, pois sua mente é sonolenta de uma forma
descompensada. Torno a repetir: é uma alma penada.
Aqui trago o
seguinte relato que ouvi de minha saudosa vó, que lá pras bandas do interior,
chamado de Seridó, onde habitava o preguiçoso maior.
Seu nome era
Faustino, que recebera em pia batismal. Era fraco, franzino, possuía em seu
corpo um pecado capital.
Me refiro à
preguiça, que tem o poder de escravizar o ser vivente, tornando-o fraco,
incompetente, indo a ser um pobre indigente.
Vivia no interior,
Faustino em sua rede, não queria guerra com ninguém, porém era objeto de riso.
Sua atitude era dar o máximo do mínimo.
Sua esposa era a
maior vítima desse caráter devedor, pois lhe faltava a figura de um chefe
provedor. Porque Faustino dizia que não podia trabalhar, pois era cheio de dor.
Mas pra comer era
ligeiro, feito todo esmeril. Embolava rápido, era o melhor do Brasil. Ah,
caboco safado, descontrolado e vil!
Sua esposa,
Gertrudes, era muito diferente, trabalhadora e capaz. Fora criada na roça,
plantando e cuidando dos animais. Era um exemplo de mulher perspicaz.
Por isso, em sua
casa, tudo era organizado, e defeito não havia. Embora não fosse rica, com sua
agilidade, conseguiu o que queria.
Galinha no quintal
era de perder na vista, coisa linda de se ver, pois era fruto do seu trabalho,
que era um prazeroso lazer. E o marido, sem nada pra fazer.
Todo dia, o marido
insistia fortemente, implicava em comer um frango, sem ao menos jogar uma ração
decente. Só queria se aproveitar do galináceo inocente.
Era refutado pela
esposa, que jogava nas suas fuças, tamanho atrevimento, que ele não ia comer um
pinto, nem mesmo por um decreto ou juramento.
Visto que é negado
ao preguiçoso o direito ao alimento, pois, se o homem foi condenado a
trabalhar, que faça sua parte e obedeça o mandamento.
Então, Faustino
tomou o intento de todo dia ir pro roçado, cabaça cheia, facão amolado. Saia de
madrugada e só voltava quando o pôr do sol estava finalizado.
Um levava foice, no
outro era machado. Porém, diariamente, era certa a visita no roçado. Até o
olhar de Gertrudes havia mudado.
Agora era visto com
carinho pela esposa e elogiado por vizinhos, pois tinha se tornado alguém que
dá exemplo e mostra o bom caminho.
Dona Gertrudes
amoleceu com aquela atitude exemplar. Já atendia o marido em tudo que ele
pedia, lavava seus pés e lhe prestava honraria.
Então, ela se
convenceu daquele comportamento nobre. Começou a abater uma galinha por dia,
mesmo os dois sendo pobres. Pois Faustino merecia até um busto de cobre.
Passaram dias que
viraram semanas, o casal unido e feliz. Agora, a esposa, ciente de que tinha em
posse um roçado farto, porém desconfiada. Quando vem muita carne no prato.
Durou seis meses
essa farsa. Pois Faustino era mala, era um embuste verdadeiro. Enganou sua
mulher e comeu todas as galinhas do poleiro. Ah, safado isoneiro!
Só que a justiça castiga é no mau costume. Um dia, Faustino foi atrás do
ouro e encontrou estrume.
Tomou na jaca e foi
grande o azedume.
Dona Gertrudes,
desconfiada, igual gato se escondendo, foi conferir a marmota. Elaborou um
genial plano pra isso. Resolveu de fininho acompanhar o malandro.
E aprontou logo um
jucá, um remédio para curar safadeza. Aquele enganador que usou de baixeza,
pois a esposa não merecia aquela torpeza.
Ela ficou de tocaia
e esperou, achar caroço no mingau. Muito embora não imaginasse o resultado
final, pois o mau elemento tinha feito um jirau.
A mulher, tomada de
fúria, emitia raios fulminantes para o marido golpista, que agora estava sem
saber o que fazer. Desculpas não tinha para poder dizer.
Tivera o tempo todo
deitado, parado, feito água de dengue. Era um descarado, um palhaço mambembe,
era um canalha que não merecia ser apelidado de gente.
Dona Gertrudes
mirou no queixo, porém o acertou na canela. Ele deu um berro de rasgar a goela,
chorando de dor, implorando o perdão dela.
Pra isso servir de lição, que a mentira é mãe dos vícios e o pior, a
preguiça, que mata e fere, quando a vida não enguiça. E por isso, talvez, a
coragem exista.
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